Uma gestão de números e coração
Em entrevista aos jornalistas da Assessoria de Comunicação, o presidente Neuri Freitas fala com a sensibilidade de quem presta um serviço essencial à população dos quatro anos à frente de uma das maiores empresas de saneamento do Brasil.
Revista Cagece – Na sua entrevista à primeira edição da Revista Cagece, logo no início da sua gestão, você falou que queria tornar a Cagece melhor para os colaboradores e para os clientes. Quais foram as principais conquistas desses quatro anos nessas duas áreas?
Neuri Freitas – Eu acho que, internamente, esses quatro anos acabou nos fortalecendo. Nós aprendemos mais, incorporando muitos conhecimentos em virtude, por exemplo, da situação hídrica que assolou o estado. Foi um momento em que eu vi os empregados mais engajados. Eu não sei se antes eu não via por estar em uma Unidade de Serviço, no meu quadrado. Mas quando vim para a presidência comecei a ver a empresa de uma forma mais geral. Percebi todos engajados com o mesmo objetivo: o de tentar salvar as cidades do colapso, inclusive tendo uma proximidade maior com os outros agentes públicos que trabalham no setor hídrico e que estão ligados à SRH (Secretaria dos Recursos Hídricos), como a Cogerh (Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos), a Sohidra (Superintendência de Obras Hidráulicas), a própria Defesa Civil. Então, hoje praticamente parece que é uma única empresa, cada um, claro, tendo sua responsabilidade, sua competência. Mas eu não via isso antes. Até 2015 estive na Diretoria Comercial, fiquei entre 2013 e 2015 lá, e eu não percebia isso. Mas a partir de 2015, quando essa seca começou a se agravar, a gente percebeu que houve uma irmandade maior, um aprendizado.
RC – O que você acha que aconteceu?
NF – Eu acho que todo mundo começou a entender bem o que estava acontecendo no estado e que a gente precisava se unir, precisava ter boas ideias, implementá-las, ser ágil sob pena da gente ter cidades colapsadas e, por consequência, ter alguma dificuldade na própria companhia em virtude de paralisação de funcionamento. Eu ainda sou muito financeiro, né? Não tanto como eu era em 2015, mas as coisas precisam funcionar para gerar renda, para manter o modelo funcionando, para fazer rodar a companhia. Então, se você começasse a perceber que uma cidade ia colapsar, certamente como consequência nós teríamos uma operação parada, uma insatisfação muito grande dos clientes, dos órgãos públicos fiscalizadores de uma forma geral, como Ministério Público, agências reguladoras, o próprio prefeito, Câmara de Vereadores, o governo de uma forma geral, deputados, e principalmente a população, sentindo na pele a falta d´água. Do ponto de vista de imagem pra empresa, pioraria muito, e do ponto de vista da relação com o cliente, a gente perderia muito.
RC – E qual foi a principal lição disso?
NF – Como nós conseguimos nos manter firmes mesmo em situações de dificuldades, nós percebemos que os clientes estavam do lado da Cagece quando eles viam a empresa trabalhando na madrugada, virando noite com o intuito de retomar o abastecimento de água para aquela cidade que, por alguma situação, ficou desabastecida. E isso gera para a empresa a manutenção de faturamento, de arrecadação, que também é necessário para manter a empresa funcionando e garantindo todos os direitos e benefícios dos empregados. Sempre naquela linha de que a gente não pode só pensar em um lado, tem que pensar em equilíbrio, pensar no empregado, saber que vai ser um momento mais difícil e que ele terá que trabalhar um pouco mais, terá que se doar um pouco mais, mas ele também precisa ser recompensado, sabendo que isso teria que estar, de certa forma, em equilíbrio porque a população não poderia ficar desabastecida. Eu acho que a gente acabou encontrando o equilíbrio, não sei se pela motivação diária que a gente tinha, pela própria comunicação, eu acho que a equipe de comunicação foi fundamental para esse processo. Tanto a comunicação aqui da Cagece como das outras instituições, do governo, os diversos projetos ligados à veiculação de matérias e notícias para deixar todo mundo bem informado, de sempre dar a resposta que era necessária, sempre mostrar de fato o que era o nosso trabalho. Eu acho que a gente começou a passar mais credibilidade. Eu acho que a gente conseguiu, nesses quatro anos, ter uma melhor interação, uma aproximação melhor e uma comunicação melhor com a sociedade.
RC – Você chega a se definir como “muito financeiro”. E a gente percebeu que nesses quatro anos a Cagece se mostrou mais saudável em seu caixa e em seus balanços. Como é gerenciar a saúde financeira da empresa diante dessas dificuldades que você citou vindas da seca?
NF – Logo no início eu tive muita preocupação, porque como eu sou da área financeira, como eu vinha de uma gerência financeira, de uma gerência de controladoria e de uma diretoria comercial, tinha um foco maior em resultado financeiro, de controle. Então, tive muita preocupação porque você não quer ver a empresa em uma situação crítica de não ter faturamento, de não ter o recurso para pagar as contas diárias. Então, eu sempre me lembrava inicialmente de “preciso ter dinheiro no início de cada mês”, porque dentro do nosso modelo, as maiores contas estão concentradas no final do mês e no início do mês seguinte. Então esse período é sempre muito preocupante porque o volume de recurso necessário para honrar com todos os compromissos é muito grande. Folha de pagamento dos empregados, folha de pagamento de todos os contratados, mais alguns outros insumos que são necessários para a produção de água, energia, produto químico, água bruta, e aí qualquer dificuldade nossa no pagamento de água bruta, por exemplo, acabaria também gerando dificuldade numa empresa do estado, parceira nossa, que é a Cogerh. Então isso me preocupava muito. Não foi fácil. Acho que hoje, só olhando para os últimos quatro anos, a gente acaba tendo a sensação de que “ah, passou”. Mas de fato não foi fácil, tinha mês em que nós tínhamos que ficar controlando o caixa, porque nós tivemos uma queda de receita. Nós começamos a ter um pouco mais de custos em virtude da dificuldade operacional ou daqueles investimentos que eram necessários para pegar água em outra fonte, entre outras coisas.
RC – E tempos de seca são bem onerosos…
NF – Sim, necessitou de muito recurso, mas eu também não poderia deixar de pagar o empregado ou o contratado, que era a mão de obra e a força de trabalho que poderia fazer a diferença dentro desse processo. Eu tinha um pouco mais de preocupação justamente porque eu era da gerência financeira, da controladoria. Então ia ser muito ruim, de repente, ter uma situação deficitária nas minhas mãos. Sou da área, entendo um pouco desse negócio, e de repente a empresa não consegue pagar suas contas justamente no momento em que eu estou na presidência? Então isso tinha um peso a mais pra mim. Foram quatro anos de preocupação, principalmente nos anos de 2015 e 2016, e tivemos que começar a aprender. Por isso eu falo sempre no aprendizado. Sempre falei: “pessoal, o que nós podemos fazer para reverter a situação?”, sabendo que não podíamos descontinuar uma série de serviços, não podíamos, na primeira dificuldade, já sair demitindo pessoas, até porque pessoas são necessárias para prestar o serviço que precisamos prestar. Mas aí a gente tem que ter um pouco mais de criatividade e buscar essa saída.
RC – E teve algum plano específico para manter os serviços e garantir a arrecadação necessária?
NF – A gente iniciou um plano de aumento de arrecadação e redução de custos, de otimização de gastos, e esse plano foi a nossa salvação, porque nós conseguimos tanto economizar quanto evitar o gasto em mais de R$ 100 milhões. Conseguimos seguir adiante. Um exemplo foi que nós conseguimos acelerar uma licitação para ter um único banco com a folha de pagamento da Cagece, coisa que em momento anterior nunca havia acontecido. Nós conseguimos R$ 10 milhões só com essa ação. Nós corremos atrás dos incentivos fiscais, muitos foram os valores de incentivo fiscal que nós conseguimos para ter uma redução do nosso gasto e para gerar caixa, manter a operação como deveria. Nós atacamos aquelas contas que eram mais significativas, energia elétrica por exemplo. Tentamos reduzir o preço da energia junto a Enel, não conseguimos, mas conseguimos, do ponto de vista operacional, melhorar várias estações. Tinha uma estação na ETA Gavião, que a turma chama de “Gavião Velho”, que nós desativamos o bombeamento sem prejudicar o abastecimento. Nós conseguimos abastecer sem precisar estar com o bombeamento ligado. Só essa ação reduziu R$ 6 milhões em um ano. Certas coisas, quando víamos, pensávamos: “meu Deus, como é que não tínhamos visto isso antes?”. Era um dinheiro que não precisávamos estar gastando. Além disso, nós negociamos com fornecedores, pedimos desconto nos contratos que nós tínhamos na empresa. Nós pedimos redução de todos os contratos para reduzir reajuste. Então, no final, ou teve redução ou evitou que no ano seguinte nós tivéssemos um gasto ainda maior em virtude de uma condição contratual. Procuramos produtos similares para substituir um ou outro produto que era mais caro.
RC – E onde a dificuldade foi maior?
NF – O ano de 2016, acredito que tenha sido um dos piores, porque a seca começou em 2012 e nesse ano ainda tinha água armazenada, em 2014 já estava ficando ruim, em 2015 ficou pouco pior, em 2016 piorou de vez o negócio. E para vocês terem uma ideia, a Cagece, que fatura na casa dos R$ 120 milhões por mês, terminou o ano com o caixa com R$ 1,9 milhão. Para a Cagece, esse valor é nada. Se, de repente, eu tivesse um dia de pagar a folha, não daria, porque a folha é muito mais do que isso. E se você só tem R$ 1,9 milhão, você não paga. Então era sempre aquela correria para juntar o dinheiro e pagar. Se a gente não fizesse isso, poderíamos não ter uma folha paga, um empregado insatisfeito com as contas dele vencendo, alguém cobrando, ou negativando ele em algum serviço de proteção ao crédito. Algumas coisas nós priorizamos e tivemos um cuidado especial. Mas assim, hoje, depois de passado tudo isso, eu vejo que teve o aperreio, mas nós superamos.
RC – A Cagece conseguiu fazer a sua tarefa porque manteve certo nível de investimento e ampliação do sistema de água e esgoto. Como foi esse desafio de manter esses investimentos diante de uma situação de escassez hídrica e de caixa?
NF – Eu diria que, nesse ano de 2018, como foi um pouco do ano de 2017, nós passamos a ficar numa situação melhor do ponto de vista de caixa. O nosso número de investimento nos últimos quatro anos, contabilizando até setembro de 2018, é superior a R$ 700 milhões para água, esgoto e infraestrutura de uma forma geral. A grande parcela ainda foi para a água, mas nós tivemos muitos investimentos na área de esgoto, que a nossa cobertura saiu de 57% em Fortaleza para 62%, percentual significativo. Está longe do que a gente precisa? Está, mas o setor tem uma série de dificuldades. O volume necessário de recursos é muito alto. A gente estima que nos municípios em que a Cagece opera, nós precisamos de R$ 16 bilhões para universalizar. Só pra fazer um cálculo de referência: a gente fatura R$ 1,3 bilhão por ano, se a gente não gastasse com nada, ainda assim seriam treze anos para universalizar só com a arrecadação, se a gente não tivesse os gastos. É claro que a gente recebe R$ 1,3 bilhão, mas gasta com operação e não sobra isso. Isso para vocês verem o desafio que é para o setor. Também nesses quatro anos nós tivemos todo um efeito político e econômico no país. Tivemos uma situação política que foi bem ruim para o setor porque a gente dependia, para fazer investimentos, de recursos da União, e a situação não ficou boa. A própria crise econômica que se abateu acabou gerando também um série de impactos na empresa. Mas apesar disso, eu acredito que nós estamos vivenciando os maiores investimentos da Cagece nos últimos anos, nesse período de quatro anos.
RC – Teve alguma estratégia ou alguma diretriz da sua gestão nessa área para a captação de recursos?
NF – A gente tentou. Nós temos ainda algumas limitações e não dá para fazer tudo. Mas nós conseguimos muitas coisas. Então, do ponto de vista de financiamento, nós tínhamos muito recurso captado que precisava só seguir com as obras e procedimentos, e assim nós fizemos, tentando acelerar, dentro da nossa capacidade, o que dava pra fazer. Nós conseguimos empréstimos recentes para melhorar equipamentos, caminhões vácuo e jato, que hoje são uma grande dificuldade para as unidades. Nós conseguimos um financiamento com o BNB (Banco do Nordeste) no início de 2018, que é um investimento relevante e que vai melhorar o sistema de água e esgoto de Maracanaú e no sistema de esgoto de Fortaleza, e vai garantir a compra de muitos equipamentos para a melhoria da operação na parte de esgoto das Unidades de Negócio (UNs) da capital e do interior. Estamos agora num processo de captação junto ao FGTS, a nossa ideia é captar mais uns R$ 400 milhões e não sei se teremos tempo até o final do ano de finalizar essa operação, mas está em andamento.
RC – E como você avalia a participação do Governo nesse processo?
NF – Nós tivemos um apoio grande do Governo do Ceará, do governador Camilo Santana, que nesse período de estiagem entendeu que a situação era crítica em virtude da escassez, e ele precisava nos ajudar. Então o próprio governador, quando ele não conseguia com os próprios recursos, ele corria a Brasília pra tentar alguma melhoria. Nos dois primeiros anos, com o governo de Dilma Rousseff, tinha uma facilidade maior, mas mesmo no governo Michel Temer, ele (Camilo) conseguiu trazer muita coisa pra ajudar aqui na seca do Ceará.
RC – O próximo governo, o de Bolsonaro, assusta?
NF – Olhe, o próximo governo é uma interrogação muito grande. Eu não sou muito favorável ao discurso que eu tenho ouvido do governo, do próprio Paulo Guedes, que certamente será o ministro da Economia, como eles estão chamando, que vai juntar Ministério da Fazenda, Planejamento e Indústria. Ele tem uma visão muito liberal, na ideia dele o Estado não devia ter estatais, a ideia é privatizar tudo. Eu acho isso um discurso de quem quer se livrar de alguma coisa ou de quem não quer assumir um desafio, um objetivo. Parece mais um discurso de incompetência: “eu não tenho competência para ter uma estatal então eu vou vendê-la”. Eu não compactuo com esse tipo de discurso. Além do mais, não acho uma boa vender uma estatal para pagar dívida, porque você contrai mais dívida e depois não vai ter mais o que vender. Então não sei se é a melhor estratégia. Eu não conheço bem a economia brasileira, o que eles vêem lá, o que eles estudaram dentro desse momento de eleição, mas não me parece razoável esse tipo de medida, nem essa coisa muito radical.
RC – Até porque o saneamento parece não estar na prioridade do governo…
NF – Sim, e como a gente tem um desafio muito grande, ficou mais fácil dizer assim: “não consigo fazer, vou mandar o privado fazer”. Mas não é bem assim. Está aí toda essa discussão da Medida Provisória do Saneamento, que, pra mim, é um atentado ao saneamento. Porque primeiro tira a autonomia dos municípios e do estado. Tem um artigo lá, o 10A, que diz que ao final da concessão com uma concessionária pública, o município não ver ter mais a prerrogativa, mesmo querendo, de renovar com a concessionária pública. O município vai fazer uma licitação se tiver alguém interessado. Essa situação gera aquela coisa: “quem está interessado por um município deficitário?”. Eu acho que ninguém vai se interessar. Mas certamente vai chover de interessados por municípios que são bons superavitários. Isso vai fazer com que a gente separe o município que é bom, que dá pra pagar as contas, que subsidia aquele município que hoje não consegue bancar o setor, dos municípios que não conseguem ser sustentados. E aí pra quem vai ficar essa conta? Ou pro próprio município que é o poder concedente, ou pro estado através das suas companhias estatais. Me parece que é um erro. Eu não sou contra a participação da iniciativa privada, mas no formato que está sendo feito, estão sendo tiradas as companhias estaduais e colocando privadas, quando a gente deveria era juntar forças para evoluir no setor. Hoje, o cenário que está posto é que nós vamos criar uma briga entre o público e o privado, as companhias estatais e o privado, porque ninguém vai querer perder aquele município que é mais rentável.
RC – Se a própria captação de recursos já era difícil, agora com o desinteresse, se essa MP passar, por municípios deficitários, pode-se considerar isso um retrocesso na meta de universalização?
NF – Para o estado de uma forma geral, sim. Porque imagina, nesse formato que essa MP está trazendo, o seguinte: “município, terminou a concessão aí com a concessionária, faça o seguinte, pergunte no mercado se tem alguém interessado. Tem um, pelo menos, além da própria concessionária? Tem. Então licite”. Vamos pensar no caso de Fortaleza. Certamente vai aparecer muita gente interessada em Fortaleza. Hoje, nós temos a cidade dentro de um modelo regional, com subsídio cruzado, onde todo mundo se ajuda. Na hora que você licita só Fortaleza, é só Fortaleza. E os outros? Estão fora. Amanhã, se um município como Campos Sales terminar o contrato com a Cagece, ele vai ter que consultar o mercado por força dessa MP, caso vire lei. Será que essa empresa que está ganhando dinheiro em Fortaleza vai querer ir lá pra Campos Sales se esse município for deficitário? Eu acho que não, na visão de empresário.
RC – A Cagece se articula nesse movimento também?
NF – Nós não podemos entrar com uma ação, mas nós nos articulamos em nível de associação lá em Brasília. O que essa MP também pode causar é uma guerra jurídica no país, que não vai ser bom para eles porque não vai destravar pra eles, como pode travar pra gente, ou seja, fica o setor preso numa discussão jurídica sobre o tema. Por isso que a gente acha que esse não é o melhor modelo. O Marco Regulatório do Saneamento precisa de uma revisão, mas não nesse formato, porque nesse formato fica aparente que quem deu todas as diretrizes para essa MP foi o setor privado. Nós não fomos ouvidos. Quando nós ficamos sabendo dessa medida, já estava tudo pronto, foi só pra nos apresentar e pra dizermos “amém” e seguir. Mas aí nós vimos o tamanho do problema e começamos a entrar na briga pra se articular e tentar barra. Nesse cenário das privatizações, nós poderíamos e até deveríamos ser mais parceiros nesse sentindo. Mas não nesse formato de um tirar o lugar do outro. Acho que tem lugar pra todo mundo.
RC – O Plano de Segurança Hídrica foi implantado pela Cagece de uma forma recorde. Você consegue puxar na lembrança e falar se naquela época a Cagece estava preparada para um plano como aquele? E hoje já se pensa em novas ações voltadas para a segurança hídrica?
NF – A primeira ação de 2015 foi pensar o Plano de Segurança Hídrica. Trabalhamos com uma equipe técnica e, praticamente, atuei como um técnico para montar aquele plano, chamando e conversando com todo mundo, com os gerentes das unidades da capital e do interior, com os gerentes da área de operação, perguntando o que dava pra fazer. Conversamos com a engenharia e com a área de projetos e saíram boas ideias. Reduzir em 20% do consumo, ter uma oferta reduzida lá no Gavião, entre outras ações. E acho que algumas não podem ser interrompidas, como é o caso da retirada de vazamentos. Hoje, nós não temos tantos casos de vazamentos por muito tempo. Pode acontecer? Pode, a empresa é muito grande, falhas acontecerão, não são propositais, não são por alguma deficiência. Mas a gente retira vazamento hoje dentro de seis e oito horas, em média. A nossa obrigação, com base na regulação, é retirar em até 24 horas. Hoje, vejo que melhoramos muito e isso gerou um benefício pra gente, porque no lugar da água estar vazando, ela está dentro da rede indo pra algum lugar que precisa de água. O reúso do Gavião é uma das melhores ações do Plano, uma das que mais gerou benefícios pra gente, porque nós conseguimos reaproveitar quase 500 litros/s. É muita água.
RC – E temos toda uma expectativa com a usina de dessalinização. Será um grande legado?
NF – Ainda é um projeto, mas depois de construída, será um legado. A gente ainda está na semente, cultivando pra dar certo. Não tem mais como voltar atrás.
RC – E como foi a sua aproximação com os colaboradores do interior, tanto do ponto de vista do relacionamento quanto de conhecer as dificuldades de quem trabalha lá? Como você avalia essa relação entre a diretoria e as Unidades de Negócio no interior?
NF – Não só para as unidades do interior, mas para todas as unidades, sejam elas de negócios ou de serviços, nós tentamos nos aproximar, e eu acho que a gente conseguiu estar mais próximo e saber um pouco mais as necessidades das unidades em virtude dessa aproximação que nós fizemos. Não especificamente por uma visita que fizemos, mas pela forma como o processo foi conduzido entre diretoria, superintendências e gerências. Claro que as visitas ajudam a ver de perto a situação. Eu acho que a gente começou a se integrar muito mais. Tivemos brigas? Diversas. Entre os diretores, tem momento que a gente acaba se exaltando. Já houve reunião da diretoria em que nove horas da noite a gente tava num bate-boca, acabou a reunião, cada um foi pro seu lado, e de repente um começa a mandar mensagem pedindo desculpa pro outro. As discussões são boas, são valiosas, e é normal divergir. A crítica vai existir e a cobrança também, mas isso fez com que todos percebessem que a gente tava ali com um objetivo único, que era melhorar o abastecimento das cidades, de ter uma melhor gestão da unidade, de gerar o melhor resultado. E isso aconteceu. Quero até registrar e agradecer toda a gestão. Eu sempre disse que a gestão não era só minha, era de todo mundo: minha, dos demais diretores, superintendentes, coordenadores, do governo. Não dá pra gerenciar só. Ou você tem ajuda, ou não vai funcionar. E eu acho que funcionou porque todo mundo começou a entender. Então agradeço a diretoria que trabalhou comigo nesses quatro anos. A Diretoria de Operações com o Josineto Araújo, o Sávio Braga e o Rogério Leite, além de todos os superintendentes que passaram. A Cláudia Caixeta, que ficou um período com as Diretorias do Interior e da Capital e a área comercial, e depois o Hélder Cortez ficou com o interior. O Dario Perini (Diretoria de Gestão Corporativa) com aquela visão dele mais de finanças, é o cara que é necessário e que vai dar uma garantia pra gente na questão financeira. Francied Ciriaco (Diretoria de Planejamento e Governança) em todas as tratativas em relação aos financiamentos e projetos. José Carlos Asfor (Diretoria de Engenharia) dentro de todo o projeto de engenharia, porque é uma loucura esse negócio da engenharia, é como se a gente tivesse duas Cageces e o José Carlos é de uma Cagece e todos os outros diretores são da outra Cagece, porque os outros são da operação. É um mundo paralelo. E tem o Sileno Guedes (Diretor Jurídico), que tudo que acontece nas outras áreas, passa por ele. Os problemas de todo mundo passa por lá. E (Sileno) também tem feito um esforço grande pra ajudar todo mundo. claro que a gente sabe das dificuldades de todas as áreas. Mas assim, acho que nós conseguimos fazer algo de bom, deixar a Cagece no caminho certo. Sobrevivemos e ainda fizemos muito mais, muitos projetos ainda estão sendo executados, muita coisa boa que certamente virá no futuro. Geralmente nos momentos difíceis você se apega em algum objetivo e se envolve com algumas pessoas e dali nasce uma coisa virtuosa, ou seja, de todo mundo perceber a importância do trabalho. Os colaboradores que estão no interior, principalmente, veem isso. Se está faltando água, todo mundo sabe quem é o empregado da Cagece, e ele acaba sentindo na própria pele a cobrança, pois mora na cidade, todo mundo sabe que ele é da Cagece, que ele trabalha com isso e está faltando água, o que ele vai dizer em casa? Então isso dá um algo a mais na relação com o trabalho.
RC – Qual foi o seu sentimento quando você ficou sabendo que seria diretor-presidente da Cagece? Dormiu nessa noite ou não dorme desde essa noite?
NF – Eu dormi (risos). Eu não tenho uma característica de muita empolgação, sou mais reservado. Tinha toda uma ansiedade antes de ter a confirmação. Depois da confirmação, eu pensei: “meu Deus, e agora? O tamanho dessa empresa, a responsabilidade que é isso.” E como eu sou da casa, é como o colaborador que mora na cidade, agrega um pouco mais de peso e responsabilidade. Mas assim, tudo que é novo dá uma sensação no peito de ansiedade. Eu realmente tive meus receios. Mas eu também confiei e acreditei em quem estava comigo, acreditei na oportunidade de ter esse cargo sob o meu comando. E o pensamento que comecei a internalizar é que não podia decepcionar, tinha que fazer o meu melhor e assim tenho feito até hoje. Em certas medidas até prejudico o meu pessoal para priorizar o profissional. Às vezes me sinto desconfortável em tirar férias.
RC – E diante de tantos compromissos e desafios impostos pelo cargo, como é conciliar a gestão da Cagece e a família?
NF – Eu tive que pactuar algumas coisas. Fiz um termo de acordo lá em casa. Contei que assumi a presidência da Cagece e quando eu estava na Diretoria Comercial eu já via como era a movimentação, o dia a dia, e disse que tinha a proposta e que certamente teria um pouco mais de ausência, que não teria os horários tradicionais de sair e chegar do trabalho, finais de semana e tudo. Primeiro eu pactuei isso com minha família para, em seguida, assumir o cargo e trabalhar. É claro que esses últimos seis anos, contando com o período da Diretoria Comercial, a minha filha Laís tinha seis anos. A gente perde muita coisa do dia a dia, mas eu nunca fui ausente, nunca fiquei longas temporadas fora. Sempre estou presente em qualquer discussão, em qualquer momento. E também uma coisa que eu faço é sempre viajar nas férias. Fiz algumas coisas diferentes que não fazia antes. Então viajo e vai todo mundo. Claro que nunca viajo sem celular, sempre olho o celular, sempre pergunto alguma coisa. Mas está dando certo. Não tenho cobranças de estar mais na Cagece do que em casa. Acho que a Laís não tem do que reclamar, a Rafaela (esposa) entendeu que o momento seria mais de trabalho e dificuldades. Ela também sabe porque falo muita coisa em casa, mostro a situação, então deu certo. Eu acho que não comprometeu. Nunca reclamaram (risos). Mesmo estando aqui, estou presente. ?